[Colaboração da pesquisadora Mariana Passos, Doutoranda em Comunicação Social pela Escola de Comunicação e Artes/USP]

Muito tem se falado sobre a questão dos mitos políticos latino-americanos e suas possíveis desestabilizações devido às atuais conjunturas políticas desfavoráveis – como exemplo o mito de Hugo Chávez que pouco se sustenta com o governo atual de Maduro na Venezuela; e o mito de Lula, ex-presente do Brasil que foi investigado na semana passada como parte das ações da Operação Lava-Jato.
Lula
Os estudos que envolvem o tema do mito são, em sua grande maioria, de uma complexidade justificável: entender a esfera do real a partir de um conceito simbólico e subjetivo requer um grande arcabouço de análise e entendimento do contexto social em que se insere tal mito. Essa complexidade também atinge os estudos que procuram desenvolver pesquisas sobre o conceito específico do mito político já que tal conceito envolve questões que abarcam o imaginário coletivo de determinada sociedade e buscam no campo simbólico a racionalidade necessária para se compreender a experiência humana de sociabilidade em seus dados momentos históricos.
Obviamente o conceito de mito político é amplo e perpassa variadas linhas de estudo como a antropologia, a ciência política, a sociologia e a psicologia social. Mas o campo da comunicação hoje em dia é igualmente fundamental para o entendimento de tal conceito. Portanto, compreender e analisar o mito político na sociedade contemporânea e midiatizada em que vivemos é um desafio para qualquer pesquisador, mas também é importante para delimitar os rumos que a política pode vir a tomar.
Sabe-se que a noção de midiatização está se redescobrindo e se refazendo com a crescente e forte presença das mídias digitais em todos os âmbitos sociais. Alguns estudos atuais da comunicação apontam para uma tendência à evolução dos processos midiáticos que proporcionaria mudanças estruturais no funcionamento das dinâmicas sociais. Nesses estudos a sociedade midiatizada confere um caráter total de importância aos meios de comunicação na sociedade de modo que estes deixam de ser apenas transportadores de sentidos ou espaços de interação e se tornam matrizes de produção e organização desses sentidos.
A midiatização passa, então, a ser a referência para as práticas sociais, para os processos interacionais e para a organização social. Os processos sociais específicos passam a se desenvolver segundo lógicas da mídia.
Uma das formas de se compreender tais mitos políticos e a dissipação ou circulação desses discursos na sociedade midiatizada em que vivemos pode se dar a partir da análise da utilização das chamadas mídias sociais e a conversação que se dá nesses espaços de discussão pública online. A análise de redes para mídias sociais e posterior análise de conteúdo dessas conversações em rede podem esclarecer e trazer à tona tendências importantes seja de ampliação e crescimento ou de morte e esquecimento dos mitos.
O Twitter, por exemplo, que se caracteriza como ambiente favorável à coleta de dados das conversações dos usuários pode ser uma ferramenta importante para essa análise.
 
Exemplos de pesquisa empírica 

  • Em abril desse ano completa-se 3 anos da morte de Margareth Thatcher que se tornou um importante mito político europeu. Conhecida como a “dama de ferro” por suas características conservadoras, Thatcher permaneceu como primeira-ministra britânica por 11 anos e seu legado político ainda deixa rastros. A persistência de sua imagem política e a tentativa de resgate de seu mito por políticos e partidos britânicos mais contemporâneos é algo que pode ser melhor compreendido a partir da análise de redes e conversações online. O que se conseguirá analisar a partir dessas conversações online é se há conservação da memória do mito Thatcher ou se, pelo contrário, houve um apagamento desse discurso político dentro das esferas de discussão pública.

Margaret Thatcher

  • Lula foi o assunto mais comentado no Twitter em 04 de março devido às ações da política nos mandados de busca na residência do ex-presidente. Os dados coletados a partir dessa data são capazes de ilustrar as tendências de dissipação do discurso e da narrativa política do chamado lulismo.

Assuntos no Momento

  • No último dia 05 de março completou-se 3 anos da morte de Hugo Chávez e o ex-presidente venezuelano também foi assunto bastante comentado no Twitter. Um fato interessante: quando Chávez abriu sua conta do microblog em abril 2010, a Venezuela apresentou um crescimento considerável do número de usuários no Twitter que queriam acompanhar o discurso de Chávez. Desde então o país apresenta números crescentes de acesso à essa mídia social que já faz parte importante da análise da comunicação política do chavismo.

Chaves
Não se pode mais negar a importância da conversação online na análise das narrativas e discursos políticos circulantes. A esfera de discussão pública online capacita o cidadão comum a gerar conteúdo, o que pode influenciar diretamente em ações de comunicação política de partidos ou governos. Para entender o que se diz a respeito do lulismo ou do chavismo há de se entender, portanto, não só as conjunturas políticas, sociais e culturais atuais de Brasil e Venezuela, mas também o que se tem falado sobre ambos os mitos na conversação cotidiana das mídias sociais. Ou seja, as mídias sociais são indicadores importantes na análise comunicacional e política desses mitos.

Leia mais da autora: “Conservação da Memória Política: A Transmissão da Narrativa Chavista no Twitter
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* As opiniões expressas por professores e articulistas convidados não representam necessariamente as opiniões do IBPAD.

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