Previsão política no Brasil

Compreender o cenário brasileiro atual passou a ser um grande desafio para diversos acadêmicos e profissionais do mercado de relações governamentais. A análise das instituições políticas brasileiras passou por várias fases desde a redemocratização e buscou, em sua maioria, compreender os diferentes contextos políticos através da descrição de elementos contemporâneos e de tendências construídas a partir de comportamentos passados.

O Impeachment

No entanto, a singularidade e complexidade do processo de impeachment do atual Governo Federal gerou esforços mais robustos em seu aspecto metodológico, seja pela análise descritiva de uma gama maior de dados ou pela previsão inferencial do comportamento parlamentar delimitada por ferramentas estatísticas já consolidadas na academia, mas ainda pouco mobilizadas pelo mercado de assessoria e consultoria.

Papel da Análise de Dados
A função da análise de dados, principalmente nestes últimos casos, não é criar pressupostos rígidos, mas orientar compreensões e agregar valor à análise do conjunto de eventos simultâneos envolvidos no processo de impeachment.
Algumas compilações das diferentes análises descritivas e previsões inferenciais do impeachment já foram realizadas pelo Blog Análise Real e pelo Jornal Nexus, mas cabe ainda descrever um pouco melhor cada caso proposto, controlando a evolução de complexidade das ferramentas de análise de dados utilizadas e mostrando como tal análise é um fator de diferenciação, tanto em termos acadêmicos como mercadológicos.

OS ESTUDOS DESCRITIVOS
O valor de estudos e análises que apresentam os dados de forma organizada é indiscutível. Coletar os dados corretos e criar parâmetros de arranjo que gerem informação é a base da análise institucional e da consultoria política nacional. A maioria dos esforços de análise do impeachment fazem exatamente isso: sistematizam o posicionamento dos parlamentares, em primeiro momento majoritariamente deputados, em relação à votação do impeachment através de alguns critérios compreendidos como relevantes. Selecionamos os principais e cuja exposição dos dados é feita de forma simples e compreensível.
 
Placar do Impeachment (Estadão)
Em uma análise descritiva simples, o Placar do Impeachment organizado pela página de Infográficos do Estadão, apresenta o posicionamento explícito dos Deputados Federais. O site permite a busca de cada parlamentar por nome, estado e partido e ainda destaca uma evolução temporal dos diferentes posicionamentos agregados (favorável, contrário, indecisos e não responderam) desde o dia 05 de Abril.
 
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Opções de dados agregados e de busca controlada disponíveis no Portal

 
A delimitação dos posicionamentos ainda destaca Deputados que mudaram de voto entre um dia e outro e aqueles que pertenceram à Comissão Especial.
 
Placar do Impeachment na Câmara (Folha)
No dia 12 de Abril, a Folha de São Paulo liberou os resultados de uma pesquisa de opinião realizada com os parlamentares a respeito de seu posicionamento em relação ao impeachment.
Na compilação dos dados, são descritas nominalmente as respostas dos 513 parlamentares, e a pesquisa por ser feita controlando partido, estado e voto declarado.
 

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Controle de votos agrupados favoráveis ao impeachment, disponível no site

 
 
Painel do Impeachment
O Painel do Impeachment, criado pela Prospectiva Consultoria com apoio da Strategos Empresa Jr. de Consultoria Política, é uma análise descritiva diferenciada por apresentar várias dimensões de critérios considerados relevantes para compreensão do cenário político atual.
O Painel é composto por (i) uma linha do tempo com todos os acontecimentos relevantes ao processo de impeachment, levando em consideração as delimitações constitucionais previstas; (ii) um painel que organiza os acontecimentos como sendo favoráveis ao governo ou à oposição, dentro das dimensões político, jurídico, repasse orçamentário, midiático, social e regimental/institucional; (iii) uma breve explicação das etapas do processo de impeachment, de forma bem didática; (iv) um “pêndulo de votos”, com votos declarados e previsão intuitiva de direção dos indecisos; (v) posicionamento dos principais grupos de pressão da sociedade civil; e (vi) uma análise de mídias sociais em tempo real.
 

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Painel principal de pesquisa disponível no site

 
A estratégia analítica e esforço de estruturação de dados de ambas empresas alia mecanismos de coleta de dados à clara experiência no âmbito de consultoria. Segundo metodologia descrita no Portal, os “votos declarados” são baseados em posicionamento proferidos em discursos de Plenário e Redes Sociais. A previsão dos “votos indecisões” leva em consideração: com peso alto a) taxa de governismo (baseado no Basômetro do Estadão); e o b) posicionamento do partido; com peso médio, c) “Efeito da Lava Jato”, considerando parlamentares envolvidos nas investigações tendem ao impeachment pela possibilidade de “esfriar” as investigações; e com peso baixo, d) nomeações e e) bancadas estaduais.
 
Mapa do Impeachment
Organizado pelo Movimento Vem para Rua, o Mapa do Impeachment foi criado como forma de abrir um canal de comunicação entre a sociedade civil e os parlamentares, através da divulgação do posicionamento de cada um. Assim como a maioria dos painéis descritivos, ele lista os Deputados de todos os estados e indica seu posicionamento em relação ao impeachment, divulgando meios de comunicação para que o indivíduo solicite prestação de contas ao parlamentar.
 

mapa do impeachmente

 

Página inicial do Mapa do Impeachment, com resumo dos dados agregados

 
 
PREVISÕES INFERENCIAIS DO IMPEACHMENT
O grande diferencial das propostas inferenciais de análise é a utilização do método científico através de ferramentas estatísticas para o cálculo da probabilidade de comportamento dos indivíduos. O termo inferencial implica a transposição do resultado encontrado pela análise de uma amostra para o todo estudado, a partir de controles matemáticos e estatísticos. Assim, os modelos científicos propostos podem ser replicados posteriormente para verificação, uma vez da existência de transparência mínima metodológica.
Mesmo não sendo prática cotidiana dentro da área de consultoria política, a maioria dos portais de previsão da votação do impeachment utilizam as metologias quantitativas de coleta e análise de dados para gerar previsões probabilísticas de resultado.
 
Blog Almoço Grátis (Estadão)
O Blog Almoço Grátis, do Estadão, gerido por Eduardo Zylberstajn, Bruno Oliva, Raone Costa, Alison Oliveira e Gabriel Dib, propôs um modelo estatístico probit, desenhado por Guilherme Stein (FEE/RS), Marcelo Griebeler (UFRGS) e Eduardo Zylberstajn (Fipe e EESP/FGV). A lógica por trás deste tipo de modelo é o cálculo das probabilidades de ocorrência de um fato ou de sua não ocorrência. Neste caso, a opção estatística foi utilizada por considerar o “sim” ou ausência dele na votação do impeachment.
O cálculo da probabilidade proposto pelos autores do modelo considera: a) posicionamento do partido; b) bancada de estados, c) se o parlamentar é titular ou suplente, e d) a taxa de governismo do Basômetro. A partir de 10.000 simulações, os autores encontraram um intervalo de resultado entre 342 e 369 votos pelo impeachment.

 
 
Polling Data
O Polling Data é um esforço do pesquisador Neale Ahmed El-Dash e trabalha com modelos estatísticos para a previsão de diversos cenários, majoritariamente eleitorais e de avaliação de governo, a partir da compilação de distintas bases de dados.
No caso do impeachment, o pesquisador criou modelo para a votação na Câmara dos Deputados, considerando a) histórico de votações parlamentares, b) faltas e abstenções em 2015-2016, c) posicionamento do partido e d) resultado da Comissão do Impeachment.
O posicionamento dos partidos e as faltas/abstenções são tidos como controles no modelo e a partir de sua manipulação é possível prever diferentes resultados para a votação.
 

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Simulação de votação em Plenário, disponível no blog, com última atualização em 12/04.

Todo o site e a análise realizada pelo Polling Data foi feita em R utilizando Shiny. (Conheça nosso curso de Programação em R)
 
A Árvore do Impeachment
Criada por Regis Ely, a Árvore do Impeachment é um modelo estatístico construída para previsão e explicado de forma muito detalhada e didática no próprio site. Basicamente, o autor utiliza a base de dados do Movimento Vem para Rua, analisando tanto Câmara dos Deputados como Senado Federal, e, controlando parlamentares decididos e indecisos, e considera as variáveis: a) partido e b) estado do parlamentar.
O autor utiliza o software R para análise de dados e todos os códigos utilizados e links para as bases de dados estão disponíveis no site.
 


Flávio Barros, do site (R Mining) fez diversas ponderações ao método do Prof. Régis que valem a leitura. Destacamos aqui sua conclusão:
“Dá para acreditar nessa previsão? EU DIRIA QUE NÃO. Isso ocorre por várias razões, mas dentre elas eu destacaria o fato de que não é só o partido e o estado que orientam a decisão de um deputado. Existem deputados na câmara com muito mais influência, tal que o voto de muitos pode estar condicionado a decisão do líder de um grupo. ASSIM, talvez seja necessário incluir alguma medida de influência no modelo. Talvez uma abordagem mais confiável seria verificar os grupos de deputados que tem votado junto recentemente, isto é, tentar prever o voto dos indecisos não com variáveis como o partido ou o estado, mas utilizando os “vizinhos mais próximos” em termos de perfil de votação.”
Prof. Flávio Barros (R Mining)
Possivelmente a ponderação feita foi abordada na previsão feita pelo Atlas Político.


Atlas Político
O Atlas Político foi elaborado pela Nervera, empresa de Big Data e Inteligência em Mídia Social, sob a responsabilidade de Andrei Roman e Thiago Costa.
Toda a metodologia e fontes de dados utilizados estão descritos no próprio portal, mas cabem alguns destaques. No painel principal da previsão do impeachment, o Atlas Político apresenta a probabilidade do impeachment no momento da busca (com opção de pesquisa da evolução temporal), e ainda a lista dos parlamentares, controlando nome, partido, estado e posicionamento. A listagem destaca se o parlamentar responde por processo judicial e a probabilidade individual de voto favorável ao impeachment calculada pelo modelo.
 
atlas
Painel de probabilidade do impeachment, em tempo real, disponível pelo Blog
 
Em questões preditivas, o modelo considera a) o posicionamento em redes sociais; b) posicionamento no “Mapa do Congresso”, este que é projeto do próprio Atlas Político e aloca os parlamentares em um espectro governo-oposição e direita-esquerda baseado no histórico de votações; c) posicionamento do partido; e d) bancada estadual. Após a análise individual de cada probabilidade, são realizadas 10 mil simulações Monte Carlo.
 
Blog Datafobia
Como iniciativa do Professor Dalson Figueiredo (PPGCP-UFPE), o Blog Datafobia fez uma postagem em 14 de Abril sobre a probabilidade do impeachment. Nela, o autor debate com os dados disponibilizados pela Folha de São Paulo e Estadão e com a previsão da Árvore do Impeachment de Regis Ely. Em sua previsão, Rodrigues agrega indecisos, não-declarantes, não-respondentes e não-encontrados e cria a categoria “incógnita”. Balisando seu cálculo pela taxa de apoio média de 0,62, por base das pesquisas da Folha e Estadão, o autor chega a valor próximos aos de Regis.
 

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Resultado segundo simulação do Datafobia

 
O VALOR AGREGADO DA ANÁLISE DE DADOS
É importante ressaltar que o dados coletados isolados de um interpretação conjuntural também não significam muito no contexto holístico. Aliando as duas frentes, no entanto, é possível inovar em termos de consultoria e produção acadêmica. Os modelos descritivos de análise no caso do institucionalismo político brasileiro ainda não perderam sua força, pela necessidade de simplificação de fontes de dados diversas. No entanto, fica a vontade por mais conexão entre método científica e prática mercadológica, aliando o melhor nas duas esferas e aprimorando cada vez mais as análises de dados políticos disponíveis.
 

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